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Perícia Judicial

Escavação para subsolo e danos em edificações vizinhas

* Foram omitidos os dados de identificação das partes e do objeto 

Introdução

 

A perícia realizada teve como objetivo principal proceder a análise das condições dos imóveis dos Autores, através de vistorias, levantamentos e exame documental, de modo a esclarecer aos quesitos apresentados pelas partes, para as finalidades da Ação Indenizatória de reparação pelos danos sofridos.

 

Na inicial, 3 (três) proprietários de imóveis contíguos, alegam que após iniciadas as escavações para a construção do subsolo do Edifício confrontante aos fundos com suas residências, surgiram diversas patologias nas edificações, consistentes de trincas e rachaduras. Mencionam que o laudo elaborado por profissional habilitado, e ratificado pela Defesa Civil, concluiu que a cortina de contenção de 6 metros que estava sendo executada, apresentava espaços entre as estacas, e aliado às chuvas ocorridas nos meses de novembro de 2015 a janeiro de 2016, teria provocado a movimentação do solo, resultando nas avarias existentes.

 

A Construtora Requerida informou que antes de iniciar as obras, no período de junho a dezembro de 2015, realizou vistoria prévia dos imóveis da vizinhança, que em dezembro de 2015 executou a cortina de estacas e em janeiro de 2016 iniciou as escavações, época em os Autores procuraram a Requerida narrando a ocorrência dos danos, após a ocorrência de fortes chuvas. Alega que os danos existentes seriam anteriores às obras do Edifício; que as patologias estão distantes da cortina de estaca; que entre as patologias e a obra existem construções não danificadas; que dois dos imóveis estão em litígio com o construtor devido a patologias decorrentes de vícios de construção;que a cortina de contenção não apresentou deformação. Alega ainda, que as casas dos reclamantes apresentam sub dimensionamento das fundações.

A metodologia básica aplicada foi pautada nos requisitos constantes na ABNT NBR 13752 – Perícias de Engenharia, e art. 473 § 3º do CPC. Além do exame da documentação juntada nos Autos, foram coletadas informações com os representantes das partes; realizada a inspeção tátil visual com registro fotográfico das condições atuais das edificações, prospecção do solo, e análise dos projetos disponibilizados.

Do objeto da perícia

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Imóvel A

Consistente de 3 (três) edificações térreas sobre o mesmo terreno, sendo: a) ao lado direito de quem olha o imóvel de frente, uma edificação de alvenaria com 275,28 m2, padrão normal, com idade aparente de 8 anos; estado de conservação necessitando de reparos simples; b) aos fundos contém uma edícula de alvenaria, com área de 31,04 m2, de padrão normal, com idade aparente de 8 anos, necessitando de reparos importantes; e, c) ao lado esquerdo, uma residência de alvenaria com 118,52 m2 concluída em novembro de 2005, necessitando de reparos simples. O terreno apresenta formato retangular, superfície seca e topografia atualmente plana devido a existência de aterro inclinado do meio do terreno aos fundos. A edificação com 275,28 m2 possui Alvará de Licença nº 2235/2008 de 03/07/2008, Alvará de Licença nº 3431/2014 de 04/11/2014, e Alvará de Licença nº 668/2016 de 17/02/2016. Contém garagem, sala de estar/jantar, escritório, lavabo, sala TV, copa/cozinha, depósito, jardim de inverno, suíte master com closet, suíte 01, roupeiro, suíte 02, varanda, área de serviço, área de lazer com churrasqueira e banheiro. Em estrutura de concreto armado, fundações com blocos sobre estacas escavadas, cobertura com telhas de concreto, esquadrias de alumínio, portas de madeira, piso cerâmico. A edícula de 31,04 m2 possui Alvará de Licença nº 2233/2008 de 03/07/2008 e Habite-se nº 3791/2014 com data de 13/11/2014. Em estrutura com laje, pilares e vigas em concreto armado, fundações com blocos e estacas escavadas,  cobertura de telhas de concreto sobre estrutura de madeira pontaleteada, paredes de blocos cerâmicos furados revestidas com argamassa de chapisco, emboco, massa corrida e pintura látex, banheiro, revestido com azulejos, piso cerâmico sobre lastro de concreto, externamente possui calçada no entorno, revestida com placas cerâmicas, beiral de concreto, janelas metálicas com gradil de ferro e portas de madeira. A residência de 118,52 m2 possui Alvará de Licença nº 2511/2004 com data de 28/07/2004, e Habite-se nº 3517/2005 com data de 08/11/2005. Contém garagem, sala de estar/jantar, cozinha, dois quartos e uma suíte, estrutura em concreto armado com laje, fundações sobre blocos apoiados em estacas escavadas, esquadrias de aço, piso cerâmico, portas de madeira, paredes revestidas com argamassa e pintura látex.

Imóvel B

Uma edificação residencial de alvenaria, com Alvará de Licença nº 32/2015 de 06/01/2015 e Habite-se nº 22/2015 com data de 06/01/2015, de padrão normal, com dois pavimentos, área total construída de 543,12 m2, habitada desde janeiro de 2012. Estado de conservação atual necessitando de reparos importantes. O terreno possui formato retangular, superfície seca e topografia atualmente plana devido a existência de aterro inclinado do meio do terreno aos fundos. O pavimento térreo possui garagem, cozinha, churrasqueira, SPA descoberto, atelier, circulação, banheiro de serviço, área de serviço, área descoberta de estendal, área descoberta poço de luz, sala home theater, sala de estar, lavabo, suíte 1 e suíte 2. O pavimento superior contém suíte 3, suíte 4, escritório, academia, área descoberta, varanda. Concebido com estrutura de vigas e pilares em concreto armado convencional, cobertura com telhas de concreto e telhas galvanizadas sobre estrutura metálica, lajes pré-moldadas, fundações em blocos sobre estacas, muros divisórios e paredes em alvenaria de blocos cerâmicos, revestimento das paredes com argamassa de chapisco e emboço, acabamento com massa corrida e pintura látex PVA, locais com azulejo e papel de parede, externamente revestidas com massa acrílica e tinta acrílica ,muros pintados com textura acrílica, piso em placas cerâmicas exceto nos quartos que são revestidos com laminados, forro de gesso, janelas de PVC, portas de madeira.

Imóvel C

Trata-se de uma edificação residencial de alvenaria, com dois pavimentos, sendo um térreo, perfazendo a área total construída de 418,82 m2, padrão normal. Habitada desde janeiro de 2012, necessitando de reparos simples. Terreno de formato retangular, superfície seca e topografia atualmente plana devido a existência de aterro inclinado do meio do terreno aos fundos. Trata-se de uma edificação com Alvará de licença nº 31/2015 e Habite-se nº 20/2015, ambos de 06/01/2015, contendo no pavimento térreo garagem, sala de estar, suíte 01 com closet, home theater, lavabo, escadas, cozinha, área de serviço, estendal, churrasqueira, canil, piscina. O pavimento superior possui suíte 2, suíte 3, estar, escritório, sacada. coberta com telhas metálicas. Em estrutura convencional de concreto armado, fundações em blocos com estacas escavadas, coberta com telhas metálicas, paredes de blocos cerâmicos furados revestidas com argamassa de chapisco, emboco e massa corrida com pintura, paredes revestidas com azulejos.

Imóvel D

Trata-se das obras de contenção do subsolo para a construção do edifício de propriedade da Requerida. À época da narrativa dos fatos, no imóvel da requerida era construído um subsolo de 6 metros de altura, com contenção de cortina de estacas escavadas, destinado às garagens de um edifício residencial, com área total a ser construída de 6.125,03 m2. A parede de contenção com os imóveis “A” e “B” foram executados com estacas de diâmetro 400 mm, com espaçamento variável de 700 mm a 988 mm, comprimento total de 12,00 metros, sendo 6,00 m para os dois subsolos e 6,00 m enterradas. Segundo desprende-se das fotografias apresentadas, em meados de janeiro de 2016, quando surgiram as reclamações das Autoras, as estacas e a escavação no terreno já havia sido realizada, estando a cortina sem o fechamento dos vãos, contendo viga de coroamento, escoramento e banqueta provisórios para proteção do talude.

 

Conforme o critério de abrangência das condições de deslocabilidade e deformabilidade que podem ser provocadas pela execução da escavação NBR 9061:1985[1], os levantamentos e estudos realizados pela perícia consideraram os danos em uma faixa de pelo menos 12 metros da borda da escavação:

 

[1] 4.3 Edificações vizinhas e redes de utilidades públicas

É indispensável o levantamento topográfico do terreno, o levantamento das edificações vizinhas (tipo de fundações, cotas de assentamento das fundações, distância à borda da escavação) e das redes de utilidades públicas, não só para a determinação das sobrecargas como, também, no estudo das condições de deslocabilidade e deformabilidade que podem ser provocadas pela execução da escavação. Os levantamentos devem abranger uma faixa, em relação às bordas, de pelo menos duas vezes a maior profundidade a ser atingida na escavação.

Dos condições do objeto da perícia

Imóvel A

A edificação “edícula” existente no terreno da Autora, confrontando parcialmente com o imóvel da Requerida – figura 3, apresenta danos consistentes de trincas e rachaduras nas paredes, com configuração diagonal, “deitando-se” no sentido da área escavada do terreno vizinho (D), ou do local onde teria ocorrido o maior recalque. A parede dos fundos é a mais danificada, havendo ainda afundamento do solo sobre a calçada, rachadura na base de alvenaria do orquidário, deformação parcial do piso da varanda sobre o solo e fissuras na alvenaria na parede da área de serviço, banheiro, churrasqueira e muro interno - fotografias 6 a 24 abaixo:

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fig2.png
figuras 6 a 10.png
fig15 e 16.png

imóvel B

Constatou-se danos provenientes de movimentações do solo nas paredes do atelier, sacada (terraço) do pavimento superior; churrasqueira, cozinha, área de serviço, banheiro e estendal do pavimento térreo, conforme fotografias 25 a 52 abaixo:

fig 27 e 28.png
fig 37 e 38.png

Imóvel C

Constatou-se danos provenientes de movimentações do solo nas paredes da área da churrasqueira, canil, estendal, sacada/suíte 2 e closet da suíte 2 no pavimento superior, conforme fotografias 53 a 62 abaixo:

fig. 59 e 60.png

Confrontação da situação com as condições anteriores​

Laudos de Vistoria Cautelar da Requerida

 

Os laudos de vistoria cautelar da vizinhança da obra apresentados pela Requerida, identificaram nas residências patologias consistentes de trincas e fissuras com diversas configurações e aberturas – Figuras 12 a 15.

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Confrontando o laudo de vistoria cautelar, com os danos constatados pela perícia, observou-se em relação ao Imóvel A, que os danos existentes na suíte 02 e sacada do pavimento superior, bem como aqueles existentes na parede do canil do pavimento térreo, inexistiam à época. Verificou-se que as trincas indicadas no Anexo 68/2013 (mov. 19.30) foram reparadas através de técnicas de colmatação de fissuras, e que houve o agravamento da trinca vertical nos painéis de revestimento do muro entre o estendal e a piscina.

 

Confrontando as condições encontradas pela perícia do Imóvel B com aquelas do laudo de vistoria cautelar, é possível identificar danos em comum que foram agravados, o aumento da quantidade de rachaduras e o afundamento do piso, colocando parte da residência sob risco de desabamento, o que exigiu a instalação de escoramentos.

 

As fotografias apresentadas no Anexo 17 do laudo de vistoria cautelar (mov. 19.37) referenteao imóvel C, não permitem identificar a existência de eventuais patologias pré-existentes no imóvel.

 

Em janeiro de 2016 os proprietários dos imóveis B e C contrataram a elaboração de Laudos de Vistoria dos seus imóveis. ​Confrontando as imagens dos laudos encomendados pelas partes em épocas distintas, temos as seguintes situações:

fig 19 a 22.png
fig 19 a 22.png
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Observa-se nas fotografias apresentadas nos laudos contratados pelos reclamantes, datadas de janeiro de 2016, que a escavação do subsolo estava concluída, em execução os blocos das fundações da estrutura do edifício. A cortina apresentava as estacas espaçadas com a viga de coroamento, parcialmente encoberta com lona plástica preta. Os vãos entre as estacas encontravam-se sem nenhuma proteção contra ruptura, em desconformidade a NBR 9061:1985 – Escavações a céu aberto.

Do aterro e do muro de arrimo dos Requerentes

O perfil natural do terreno dos Autores era em declive em direção ao lote da Requerida, perfazendo um desnível total na divisa de aproximadamente 3,75 m. Para a construção das residências foi executado um aterro.

 

As condições mínimas a serem preenchidas para execução de aterros em obras de construção de edificações residenciais à época, eram fixadas na norma técnica da ABNT NBR 5681:1980. Segundo a norma, nos casos de aterros com altura superior a 1,0 m era obrigatório o controle tecnológico e a elaboração de projetos geotécnicos.

 

Inexistem projetos ou controle tecnológico dos aterros executados nas propriedades dos Autores, em desconformidade às exigências da norma. Para identificar as características do solo do aterro e do solo natural, a perícia efetuou 1 (um) ponto de sondagem a percussão, na área descoberta aos fundos do imóvel B, afastada 3,20 metros da divisa com o lote das Requerida, que totalizou 13,45 metros de perfuração. Trata-se do Relatório 02 apresentado no Anexo 2 do laudo.

A construção de um muro de arrimo de concreto armado à época, deveria atender as exigências das normas vigentes - NBR 6118:2003 –Projeto de estruturas de concreto armado e NBR 11682:1991 – Estabilidade de taludes, ou seja, era indispensável a elaboração de projetos técnicos de engenharia para a execução.

 

Constatou-se que foram executados muros de arrimo com altura de 3,75 m, de concreto armado com fechamento em blocos cerâmicos sobre estacas, e sobre estes foram levantados os muros de divisa com altura de 2,30 m. Segundo o projeto de reforço apresentado referente ao imóvel A, foram adicionadas estruturas de ancoragem de concreto armado, através de estacas afastadas 4 m do arrimo, ligadas à cinta de topo com vigas de travamento. Essa mesma concepção de projeto pôde ser visualizada na casa de bombas da piscina da residência C.

Para o comportamento satisfatório de uma estrutura de contenção, é fundamental a utilização de sistemas eficientes de drenagem. Os sistemas de drenagem podem ser superficiais ou internos. As edificações possuem sistema de drenagem da área coberta, através de calhas e condutores ou grelhas no piso que conduzem a água das chuvas para a rede pública de águas pluviais. Há no entanto, áreas descobertas nas áreas de recuo aos fundos (áreas permeáveis), junto ao muro de arrimo, sem sistemas de drenagem, que permitem a infiltração das águas da chuva precipitada nestas áreas diretamente no solo, aumentando o empuxo sobre o tardoz interno do muro.

 

Muito embora a ausência de projetos e dos dispositivos de drenagem, nada constou nos laudos apresentados quanto a danos provocados por deformações na estrutura do muro de arrimo. Tão pouco o perito, na vistoria ao local, identificou anomalias aparentes no muro de divisa que pudessem ser atribuídas à deficiências na contenção do aterro. O próprio Construtor menciona que “a parede mostrada não está apresentando danos”, referindo-se ao muro de arrimo dos imóveis dos reclamantes.

 

Da escavação a céu aberto no terreno da Requerida

A previsão do comportamento de uma escavação profunda envolve análises tanto de estabilidade quanto dos movimentos do solo que ocorrerão em torno da escavação, em consequência das deformações na massa de solo causadas pelo alívio de tensões quando a escavação é realizada, que podem afetar construções vizinhas.

 

Da mesma forma, a deformação das cortinas após a escavação, é bastante relevante nos potenciais estragos que podem ser provocados nas estruturas vizinhas. Essa deformação pode ser mensurada durante a execução, através de instrumentos.

 

GUIDICINI (1984, p. 53)[1] cita em sua obra:

 

“Uma das causas mais comuns e óbvias no desencadeamento de condições de instabilidade consiste em modificar as condições geométricas da massa terrosa, ou rochosa, que esteja sendo analisada, acrescentando-lhe uma sobrecarga em sua porção superior, ou então, retirando parte de sua massa na porção inferior.”

De forma não diferente, MILITITISKY menciona”[2] :

 

“Escavações não protegidas executadas junto a estruturas existentes causam grande número de acidentes em obras urbanas por provocar instabilidade. Toda escavação, próxima a fundações existentes, necessita de uma previsão de metodologia construtiva, com programação cuidadosa das etapas e consideração dos efeitos na estabilidade das construções vizinhas.”

[1] GUIDICINI, Guido. Estabilidade de Taludes Naturais e de Escavação. Edgard Blücher. São Paulo, 1983.

[2] MILITITSKY, Jarbas; CONSOLI, Nilo Cesar, e SCHNAID, Fernando. Patologia das Fundações – São Paulo: Oficina de Textos, 2005

As condições de segurança exigíveis a serem observadas na elaboração do projeto e execução de escavações de obras civis, a céu aberto, são fixadas no Brasil pela ABNT NBR 9061:1992. Segundo a norma, as cortinas são elementos estruturais destinados a resistir às pressões laterais devidas à terra e à água; são flexíveis e têm o peso próprio desprezível em face das forças atuantes.

Além das investigações geotécnicas-geológicas do terreno onde será executada a escavação, a norma estabelece como condição indispensável o levantamento das edificações vizinhas (tipo de fundações, cotas de assentamento das fundações, distância à borda da escavação) e das redes de utilidades públicas, não só para a determinação das sobrecargas como, também, no estudo das condições de deslocabilidade e deformabilidade que podem ser provocadas pela execução da escavação.

 

É indispensável o levantamento topográfico do terreno, o levantamento das edificações vizinhas (tipo de fundações, cotas de assentamento das fundações, distância à borda da escavação) e das redes de utilidades públicas, não só para a determinação das sobrecargas como, também, no estudo das condições de deslocabilidade e deformabilidade que podem ser provocadas pela execução da escavação. Os levantamentos devem abranger uma faixa, em relação às bordas, de pelo menos duas vezes a maior profundidade a ser atingida na escavação”.

A este respeito, Yasigi Walid, na sua obra “A Técnica de Edificar”, Editora PINI, 2004, menciona:

 

Antes do início da construção, terá de ser feito um levantamento minucioso e completo da área do canteiro de obras e imediações, para verificar se existem, entre outros:

 

  • desníveis perigosos;

  • fragilidade perigosa do terreno;

  • drenos ou tubulações enterradas de utilidade pública ou de terceiros;

  • possibilidade de enfraquecimento de construções vizinhas por escavações, vibrações, etc;

  • ninhos de cupim, que nessa hipótese deverão ser destruídos.

 

Serão feitos o exame e a vistoria geral das construções vizinhas que apresentarem fundações rasas, como também quando a obra a ser executada tenha níveis de fundações inferiores, contenha subsolos ou, ainda, no caso de terrenos de pouca consistência.“ grifo nosso.

Não diferente, a obra “Fundações Teoria e prática” – São Paulo. PINI, 1998[1] menciona que os elementos necessários para o desenvolvimento de um projeto de fundações são, entre outros, os “Dados sobre construções vizinhas” consistindo de:

 

“tipo de estrutura e fundações;

Nº de pavimentos, carga média por pavimento;

Desempenho das fundações;

Existência de subsolo;

Possíveis consequências de escavações e vibrações provocadas pela nova obra”

 

A norma não foi atendida plenamente, uma vez que as vistorias foram realizadas após o início das obras (ver tópico 5.2 acima), e ainda, o relatório não descreve o tipo de fundações das edificações vizinhas, a profundidade das mesmas e a distância à borda da escavação como determina a norma.

 

[1] dos autores Waldemar Hachich, Frederico F. Falconi, José Luiz Saes, Régis G. Frota, Celso S Carvalho e Sussumu Nyama

Segundo a norma, o controle das edificações vizinhas e da escavação deve obedecer a um plano de acompanhamento, através de inspeção e de instrumentação adequada ao porte da obra e das edificações vizinhas. A necessidade de instrumentação deve constar no projeto uma justificativa para sua utilização ou não. Em relação a segurança, visa acompanhar possíveis alterações no estado de equilíbrio da área de escavação e de estruturas próximas, durante e após a execução da obra. As medições realizadas podem permitir a tomada, em tempo hábil, de providências eventualmente necessárias.

 

A deformação das cortinas após a escavação é relevante nos potenciais estragos que podem provocar nas estruturas vizinhas. Existem diversos instrumentos e ensaios para quantificar essa deformação, como inclinômetros, estação total (topografia), extensômetros para medir as deformações e os deslocamentos.

 

No seu item 5.9, Documentação técnica, a norma exige que: “Durante toda a fase de execução e durante a existência da escavação, é indispensável ter-se no canteiro de obra um arquivo contendo os seguintes documentos: e) levantamento das fundações das edificações vizinhas”.

 

Não foi realizada instrumentação da obra, e não consta no projeto apresentado justificativas para a sua não utilização. A ausência de instrumentação e observação das edificações vizinhas impossibilitou a medição das deformações da cortina e os deslocamentos do solo e a adoção de medidas preventivas. Não houve um acompanhamento da evolução das trincas e fissuras pre-existentes. Somente após as reclamações das Autoras, foi realizada a investigação das condições do aterro existente, da drenagem, e das fundações das casas vizinhas (mov. 19.4 – 19.5).

Segundo o item 5.6 -Estabilidade das escavações, e subitem 5.6.1 da NBR 9061:1992:

 

“As condições de estabilidade das paredes de escavações devem ser garantidas em todas as fases de execução e durante a sua existência, devendo-se levar em consideração a perda parcial de coesão pela formação de fendas ou rachaduras por ressecamento de solos argilosos, influência de xistosidade, problemas de expansibilidade e colapsibilidade”.

  

O item 5.7.2 menciona que no projeto de escavações, devem ser escolhidos métodos e processos de execução, tendo-se em vista obter o máximo grau de segurança.

 

No item 5.8.1 – Escoamento ou ruptura do terreno de fundação, a norma menciona:

 

Quando a escavação atinge nível abaixo da base de fundações num terreno vizinho, este terreno pode deslocar-se para o lado da escavação produzindo recalques ou rupturas. Se a escavação não ultrapassa a cota de base das fundações vizinhas, pode ocorrer diminuição da pressão normal confinante, causando deformação do terreno vizinho”.

 

 Segundo item 6.1.2, Escavações protegidas, as opções são:

 

a) cortinas com peças de proteção horizontal apoiadas em elementos verticais introduzidos no solo, antes da escavação; b) cortinas de estacas-pranchas, constituídas pela introdução no solo, antes da escavação, de peças que se encaixam umas nas outras; c) cortinas de estacas justapostas, constituídas por estacas executadas uma ao lado da outra, antes da escavação; d) cortinas de concreto armado executadas com a utilização de lamas, antes da escavação; e) cortinas e concreto armado ancoradas, executadas à medida que a escavação vai sendo executada”.

 

 Foi adotada a opção “a” onde as estacas têm um espaçamento variável de 0,7m de até 1,00m entre eixos, ficando trechos de solo descomprimidos e sem a proteção contra a chuva até que se fizesse a proteção horizontal do solo entre as estacas.

 

De acordo com a norma, deve haver sistema de proteção das paredes da escavação para evitar a descompressão do terreno de fundação, bem como evitar o carreamento das partículas finas do solo e o solapamento do terreno das fundações vizinhas, em razão da permeabilidade do solo.

 

No caso de cortina com estacas escavadas, as paredes da escavação deveriam ser protegidas com elementos horizontais. Segundo o item 8.1.1.3, a escavação no trecho junto da cortina, em uma faixa de no mínimo 0,50 m, tem de ser executada manualmente, a fim de possibilitar a colocação, um a um, dos elementos horizontais.

 

No seu subitem 8.1.3, Elementos horizontais, determina:

 

 “Os elementos horizontais são colocados no solo entre os elementos verticais, apoiados nestes a montante e comprimidos contra o solo por meio de cunhas. Se não se utilizar cunhas, deve ser procedido um perfeito enchimento entre o elemento horizontal e o solo”, já no subitem 8.1.3.3, exige: “Quanto à natureza dos materiais, os mais utilizados são os seguintes: a) madeira: pranchão; b) concreto armado: peças pré-moldadas; c) metálicos: chapas de aço”.

 

8.1.3.6 Entre as peças horizontais e o solo não pode existir vazios.”

 

8.1.3.7 Para o caso de se querer evitar o carreamento de partículas de solo pela água, quando se utilizar pranchões de madeira, deve-se colocar entre as juntas estopa, serragem ou capim e depois pregar uma ripa de madeira denominada “mata-junta”.

  

A descompressão do terreno de fundação é um fenômeno decorrente das escavações, quando a proteção das paredes de uma escavação se desloca ou de deforma, causando perturbação no terreno de fundação vizinho, produzindo recalques prejudiciais à construção.

 

Não foram tomadas as medidas de proteção da parede escavada entre os vãos das estacas, para evitar a descompressão do terreno de fundação e o carreamento das partículas finas do solo. Foi colocado somente uma lona plástica, que não comprime o solo, e deixado um patamar (banqueta de solo) com altura de aproximadamente 3 metros.

 

Constatou-se que os terrenos do imóveis vistoriados sofreram o recalque que a norma alerta que pode ocorrer com a diminuição da pressão provocada pelo desconfinamento do maciço do solo, devido a ausência da proteção horizontal da parede de escavação entre as estacas da cortina.

 

As imagens figuras 27 a 29 das condições da cortina de contenção do edifício da Requerida, demonstra o desconfinamento de estacas de construções vizinhas, que podem provocar a instabilidade das fundações das residências, e que poderia ser evitado com o cumprimento das exigências da norma.

Das fundações das edificações dos Requerentes

Procedeu-se uma análise dos projetos estruturais das casas das Autoras, e da execução das estacas, com o objetivo de verificar as reais cargas nas fundações, e a capacidade de carga das estacas.

Para as verificações, adotou-se para os materiais o peso específico do concreto γconc = 25 KN/m³ e aço de armadura passiva para concreto γs = 78,7 KN/m3.

Ações – Definições dos carregamentos

 

Ações Permanentes (G)

 

Segundo a NBR 6118/2003, são ações permanentes aquelas que ocorrem com valores praticamente constantes durante toda a vida da construção. As ações permanentes devem ser consideradas com seus valores representativos mais desfavoráveis para a segurança.

 

O peso próprio dos elementos construtivos são exemplos de cargas permanentes, sendo esses em função dos seus respectivos volumes e pesos específicos característicos de cada material.

 

Com base nos projetos estruturais e arquitetônicos fornecidos, foram consideradas as cargas das paredes, lajes pré-moldadas e maciças sobre as suas respectivas vigas.

 

 

Ações Variáveis

 

Foi considerada uma sobrecarga de 150,0 kgf/m2, em todas as lajes de uso frequente de pessoas, as lajes onde não é comum o uso de indivíduos foi atribuída uma carga de 50 kgf/m².

 

 

Combinações de Cálculo

 

As combinações das ações para o cálculo foram definidas conforme orientações da norma brasileira, em especial a NBR 8681 – Ações e Segurança nas Estruturas.

Com os elementos estruturais desenhados e definidos, com os carregamentos devidos aplicados e combinados, é obtido a envoltória dos máximos e mínimos esforços e deformações – Figuras 31 a 36:

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Figura 33 e 34 - Modelo tridimensional da estrutura do imóvel  A

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Figura 33 e 34 - Modelo tridimensional da estrutura do imóvel B

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Figura 33 e 34 - Modelo tridimensional da estrutura do imóvel C

Confrontando amostras das cargas indicadas nos projetos das áreas mais afetadas, de cada uma das casas, com os carregamentos calculadas pela perícia, foi possível identificar desvios que indicam haver pilares com subdimensionamento da estimativa de cargas para as fundações– Quadro 1. Os valores em vermelho são os considerados “subdimensionados”.

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Verificação da Capacidade de carga das estacas

A verificação foi realizada pelos seguintes métodos:

  • Método de Aoki e Velloso: Este método foi desenvolvido por Nelson Aoki e Dirceu Velloso e foi apresentado no Congresso Pan-americano de Mecânica dos Solos e Engenharia de Solos. A capacidade final de carga é dada pela soma entre a resistência lateral e resistência de ponta. A resistência lateral é obtida através da interação da área lateral da estaca em atrito com o solo, a resistência de ponta é obtida pela interação da área da estaca na base e a resistência do solo nesta profundidade;

  • Método de Décourt e Quaresma: Este método foi desenvolvido por Luciano Décourt e Arthur Quaresma, permitindo a estimativa da capacidade de carga de estacas por meio do ensaio SPT. A capacidade final de carga é dada pela soma entre a resistência lateral e resistência de ponta, semelhante ao apresentado por Aoki e Velloso. As Equações a seguir são as apresentadas pelos autores para a estimativa da capacidade de carga de uma estaca;

  • Método de Pedro Paulo Costa Veloso: Este método foi inicialmente desenvolvido para o uso dos resultados CPT. Para o uso dos resultados de ensaio de SPT, são utilizadas correlações;

  • Método de Alberto Henriques Teixeira: O método de Teixeira é baseado nos métodos de Aoki-Velloso e Decourt-Quaresma, citados anteriormente. Neste método o autor propõe a seguinte equação para cálculo da resistência de uma estaca;

  • Método de Urbano Rodrigues: Este método determina o valor da parcela de resistência lateral da capacidade de carga total do sistema solo - estaca. A determinação da resistência de ponta é feita com utilização dos métodos de AOKI-VELLOSO e DECOURT-QUARESMA, exceto no caso de estaca hélice contínua.

Os dados referentes a estimativa de carga são:

 

  1. Estaca escavada de 25 cm de diâmetro;

  2. Coeficiente de segurança = 2;

  3. Sondagem

 

Adotou-se a sondagem feita para a obra do Edifício de propriedade da Requerida, mais próxima às edificações das Autoras - Figura 41:

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Figura 41: Relatório de sondagem

 

 

CAPACIDADE DE CARGA Com os dados anteriormente informados, a capacidade de carga para ambos os métodos é obtida através da planilha de cálculo apresentada na Figura 42.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Considerando: a) a estimativa da capacidade das estacas a partir dos diversos métodos  b) as profundidades em que as estacas foram executadas, segundo os relatórios apresentados pelos Requerentes – mov. 444.18, 444.30 e mov. 19.4, descontadas as alturas do aterro;  e c) as cargas calculadas no item 5.6.1; foi possível verificar que as fundações nas áreas afetadas foram executadas de forma insuficiente para as condições de solo e de carregamento, ou seja, a carga admissível foi excedida aos coeficientes de segurança – Na demonstração dos resultados demonstrados nos Quadros 1 a 4 abaixo,  os valores em vermelho são os considerados “não admissíveis” para os respectivos métodos.

Capacidade de carga das estacas do imóvel A:

Capacidade de carga das estacas do imóvel B:

 

Capacidade de carga das estacas do imóvel C:

Das chuvas ocorridas na época do evento danoso e as possíveis consequências

A partir de dados históricos do INMET – Instituto Nacional de Meteorologia – Anexo 3, foi possível obter os índices pluviométricos desde 01/01/2014 até 16/01/2016, quando foram registradas as queixas das Autoras. Os dados foram disponibilizados no gráfico abaixo – figura 30

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

Figura 30: gráfico de precipitação acumulada diária de 01/01/2014 à 16/01/2016: Fonte: INMET

De acordo com o Boletim[1] Mensal do INMET, referente ao mês de Janeiro de 2016 constou o seguinte:

 

‘Os maiores desvios positivos de chuva foram registrados no norte do Paraná. Em Londrina e Maringá, foram registrados os maiores totais mensais de chuva da região: 433,2 mm e 419,8 mm, respectivamente. Além disso, esses valores correspondem a quase duas vezes o esperado climatologicamente para o mês de janeiro nessas duas localidades (235,6 mm e 227,2 mm). Ainda com relação a esses volumes de chuva, em Maringá (PR), por exemplo, janeiro de 2016 (419,8 mm) corresponde ao mais chuvoso no período de 1961-2015, superando janeiro de 1989, quando choveu 354,6 mm.”

 

 

As chuvas ocorridas em janeiro de 2016 foram de fato excepcionais. Sabe-se que o aumento da umidade do solo pode saturá-lo, causando problemas nas fundações das estruturas em razão da deformidade do material. Portanto, considerando as condições das fundações e das circunstâncias de risco ocorridas à época, é possível que as fortes chuvas tenham contribuído para o evento danoso.

 

Conclusões

Considerando:

 

  1. as condições das edificações dos Autores e da obra da Requrerida anteriores a janeiro de 2016;

  2. as condições das edificações dos Autores e da obra da Requerida após janeiro de 2016;

  3. as condições do aterro e do muro de arrimo do terreno dos Autores;

  4. as condições das fundações das edificações dos Autores;

  5. as condições da execução da escavação a céu aberto na obra da Requerida em janeiro de 2016;

  6. as chuvas ocorridas em janeiro de 2016 na região;

 

 

é possível inferir, que os danos existentes nas edificações vistoriadas, foram motivados principalmente por dois fatores: (i) existência de deficiência intrínsecas das fundações das edificações dos Autores; e (ii) circunstâncias transitórias de risco da obra vizinha, considerando as condições das construções e os possíveis efeitos de deslocabilidade e deformabilidade que podem ser provocados pela execução de escavação junto às fundações de edificações vizinhas, e a ausência de providências necessárias a fim de garantir a segurança das edificações do entorno. Contribuiu para o agravamento destes fatores, as fortes chuvas ocorridas em janeiro de 2016 na região.

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